quarta-feira, 2 de junho de 2010

Apenas mais uma de amor (4)

Eu estava sentado na minha mesa, olhando para a janela e vendo o tempo passar. Tinha acabado de voltar do almoço, mas já estava louco para ir embora. Tinha coisas mais importantes pra fazer. Passei o dia a olhar para a janela, sem fazer nada, não pude evitar, o céu estava incrivelmente azul, do jeitinho que eu gosto. Até que tudo mudou. Eram duas horas da tarde quando, inexplicavelmente, o azul deu lugar ao amarelo que, por sua vez, deu lugar ao laranja. Mesmo distante, pude sentir o tremor aumentando e escutar os vidros estourando. Depois disso, o ceú fez-se preto. Assim me disseram, já estava desacordado na hora. Nesse dia, confirmei duas das poucas certezas que tive na vida. A primeira delas foi a de que não devia ter saído de casa.

Meu filho acordou doente, a secretária resolveu faltar e a minha esposa estava estressada com todos os pequenos problemas. O mundo estava me mandando sinais para que não saísse de casa. Não queria ir pro trabalho, mas nada me impediria. Olhei para a janela e vi um lindo céu azul. Pensei em qual mal poderia acontecer em um dia como esse. Saí de casa pensando em comprar flores para a minha esposa, além do remédio para o meu filho, quando voltasse do trabalho. É o meu jeito, queria, ao mesmo tempo, fazer uma surpresa e ajudar. Bom, foi mais ou menos aí que o meu curto flash back acabou.

Quando abri os olhos, o preto já havia dado lugar ao azul acinzentado. Pude ver bombeiros correndo de um lado para o outro, pessoas chorando e escutar gritos desesperadores. Ninguém parecia me notar, já tinha até desistido de chamar a atenção. Não conseguia me mover e nem falar. Meus esforços não valiam de nada. Senti o preço das minhas vãs tentativas escorrerem pela minha testa. Quando elas encontraram os meus olhos, o céu ficou manchado com gotas de vermelho. Foi aí que me dei conta da profundidade do corte na minha cabeça. Foi nessa hora, também, que eu encontrei com a Indesejável.

Ela era mais bonita e mais misteriosa do que eu imaginava. Estava lá por mim. Ainda não estava morto, apenas inconsciente. Minha alma relutava em deixar o corpo. Ela olhou fundo nos meus olhos, mas não falou nada. Olhos que não demonstraram pena e nem gosto por mim. Olhos que me perguntaram se eu iria, naquele exato momento, ir com ela por bem ou por mal. O sono eterno era tentador, já tinha até me levantado pra caminhar na direção dela. Parei no meio do caminho. Pedi desculpas e dei meia volta. Recobrei a consciência e me levantei. Os bombeiros vieram na minha direção oferecendo ajuda. Rechacei todos eles, estava bem. Ruim estava a minha mulher. Ainda bem que lembrei das flores e do remédio a tempo, vai que ela se irritava mais.

Foi na hora em que cheguei em casa que eu confirmei a minha segunda certeza. Se eu demorasse um pouco mais com o remédio e com as flores, faltariam desculpas para explicar a demora.

3 comentários:

Bruninha disse...

incrível como o final da história consegue surpreender a gente! haha

Kinha disse...

Haja criatividade e inspiração oO
Adorei o post como todos os outros.
Vc sempre consegue mudar a história em cada um.
Isso que é o melhor de ser um escritor.
Não ficar em uma coisa só.
=o***

Duca disse...

ahmmm!!