quinta-feira, 9 de fevereiro de 2012

Gran finale

Estava decidida. Definitivamente estava cansada também. Há alguns meses já vinha desconfiando da fidelidade do marido, mas sem nunca encontrar nenhuma prova das traições. As coisas pioraram quando os vizinhos começaram a perguntar sobre a mulher que sempre vinha visitar o marido enquanto ela não estava. Ele, é claro, desconversava. Safado. Ela podia ser boba, mas não burra. Pediu para que a avisassem da próxima vez que a tal mulher aparecesse. Foi justamente por conta da ligação que recebeu minutos antes, que decidiu pegá-lo no flagra.

Ligou para o celular dele para avisar que demoraria a chegar em casa. Precisava deixá-lo à vontade para ter certeza que não teria dúvidas do que estava acontecendo quando chegasse. Nada a não ser a caixa de mensagens. Seria o primeiro e último aniversário de casamento dos dois. Queria só ver a desculpa que o filho da mãe daria.

Entrou em casa calada e fechou a porta devagarinho. Escutava as molas da cama gemendo no quarto. Todas as janelas e cortinas estavam fechadas, dando um ar de abandono por conta da escuridão, provavelmente para esconder a safadeza dos vizinhos, mas ela usaria isso ao seu favor. A outra não teria lugar nenhum por onde fugir a não ser passando por ela na porta. Estava caminhando lentamente ao encontro dos dois quando o barulho que vinha das molas do colchão parou. Escutou o barulho dos lençóis e de passos rápidos. Escutou o baque seco da porta do guarda-roupa, correu e acendeu a luz:

- Que palhaçada é essa aqui? -disse vasculhando o quarto com os olhos à procura da outra ou de algum dos pertences dela.
- Que palhaçada? -o descarado estava apoiado no encosto e com as mãos cruzadas sobre o lençol como se nada tivesse acontecido.
- Eu sei que você tem outra, eu e todo mundo aqui no bairro. Cadê o seu celular? De hoje que te ligo e você não atende.
- Meu amor, não poderia atender o meu celular nunca. Esse tempo todo ele esteve com você.
- Comigo!? Você tá ficando doido? Você não me deixa nem chegar perto daquele aparelho, diz que é invasão de privacidade, mas agora eu entendi tudo. Não me trate como idiota.
- Conte até três, respire fundo e abra a sua bolsa.
- Você tá de sacanagem comigo, né? -contou até dez e respirou bem fundo para não voar no pescoço dele- Se esse celular estivesse aqui, eu teria escutado ele toc... Mas como ele veio parar aqui?! Eu tenho certeza de que não peguei nele e eu teria escutado caso ele tocasse.
- Vai ver você estava tão concentrada nisso que não percebeu e...
- Não me venha com essa conversa! Ainda não terminei com você. Tinha uma vagabunda e eu sei que ela está aqui, não to ficando doida. Escutei ela se escondendo -começou a chorar caminhando em direção ao guarda-roupa- a nossa história termina aqui.
- Se você tem certeza do que está fazendo, não vou te impedir, mas por que você não respira fundo e conta até três?

Não fez o que ele pediu apenas porque considerou aquilo como um último pedido de um condenado à morte, mas porque precisava daquilo para se controlar quando desse de cara com quem quer que estivesse lá. Quando puxou a porta não acreditou no que viu. Se não fosse pelas roupas dos dois, estaria vazio. Arrastou-o um pouco para ver a parte de trás, mas nada. Rodou o quarto todo e nem sinal de mulher alguma, marca de batom, perfume, maquiagem na fronha do travesseiro, peça de roupa, nada.

Ele tirou um buquê e uma caixa de bombons finos debaixo do lençol:

- Surpresa, feliz aniversário de casamento! -gritou sorrindo.
*
Anos mais tarde, ele divertia os netos com os truques que costumava encantar as plateias quando a mulher lembro do ocorrido. Ela foi ao seu encontro e sussurrou no seu ouvido:

- Como foi que você fez aquilo?

Ao que ele prontamente respondeu, sem nem tirar os olhos das crianças:

- Um mágico nunca revela seus truques.