terça-feira, 28 de setembro de 2010

Na vida de um namorado

Inspirado na obra original de Flavio Meirelles "Na vida de um homem".

Quando você convida uma mulher para sair e vai pegá-la em casa, duas coisas podem acontecer: você pode esperar duas horas do lado de fora ou duas horas do lado de dentro.

Se você esperar do lado de fora, tudo bem, mas se você esperar do lado de dentro, duas coisas podem acontecer: ela pode te deixar esperando sozinho ou fazendo compainha enquanto ela se arruma.

Se ela te deixar esperando sozinho, tudo bem, mas se ela te fizer compainha enquanto se troca, duas coisas podem acontecer: ela pode apenas conversar ou pedir opiniões sobre a roupa e a maquiagem.

Se ela apenas conversar, tudo bem, mas se ela te pedir opiniões, duas coisas podem acontecer: a pergunta pode ser retórica ou não.

Se for retórica, tudo bem, mas se não, duas coisas podem acontecer: você pode mentir ou ser sincero.

Se mentir, tudo bem, mas se não, duas coisas podem acontecer: ela pode se irritar e negar sexo mais tarde ou acabar e arranjar outro.

Se ela se irritar e negar sexo, tudo bem, mas se ela acabar e arranjar outro, duas coisas podem acontecer: ele pode esperar duas horas do lado de fora ou duas horas do lado de dentro.

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Apenas mais uma de amor (5)

Ela esperou que eu virasse para me acertar a nuca com o secador de cabelo que estava em sua mão. Depois disso, minha visão escureceu.

Quando abri os olhos, a minha visão ainda estava um pouco turva. Tentei coçar os olhos, mas as minhas mãos estavam amarradas, bem como os meus pés. Estava atado à cadeira da cozinha que, por sua vez, não estava atada à mesa. Ela estava lá embaixo, no porão, e ambos estávamos debaixo de uma fraca luz. Aos poucos, suas pernas começaram a surgir da escuridão. Quando apareceu por completo, segurava um alicate na mão esquerda e um soco inglês na direita. Tentei argumentar e nada. Ela veio na minha direção rebolando, como quem não quisesse nada, e me acertou um direito no queixo. Preferia ter desmaiado com o primeiro.

Quebrou-me dois dentes com o primeiro, mais quatro com o segundo, não me deu nem tempo para cuspir os pedaços. Com o terceiro, ela terminou de quebrar os dentes da frente. Pelo menos o sangue que estava me deixando sufocado, caiu todo na camisa. Me perdoa, me solta agora que eu esqueço tudo isso. Ela realmente me soltou, mas não sem antes quebrar os meus joelhos. Cai no chão assim que ela cortou as cordas.

Ela me rodeou como um gato a rodear um rato. Um gato que sabia que a presa já estava com as horas contadas. Parou perto dos meus pés e se ajoelhou. Acaricou-os por um instante e arrancou a primeira unha. A partir da sétima, o meu corpo não sentiu mais nada. Ela se levantou e sentou sobre o meu peito. Tentei olhar para os seus olhos e arrancar um pouco de clemência. A única coisa que ela me deu foi um soco que deslocou o meu nariz. Sentou sobre o meu peito e arrancou as unhas das minhas mãos. A voz não saía mais da minha garganta. A forma que ela apertou o meu pescoço para abafar os meus gritos, contribuiu, mas não foi por isso que fiquei sem voz. Simplesmente não tinha mais forças. Ela levantou-se e afastou as minhas pernas com os pés. Voltou para a escuridão e voltou com um taco de golfe. Apontou-o para os meus testículos e o ergueu acima da cabeça. Desceu com toda a sua força e eu apaguei.

*

Míseros quinze segundos haviam se passado entre a primeira piscada e a segunda. Meu olhar ainda estava vago e fixo no mesmo ponto: sua cintura. Repetiu a pergunta:

- E então, você acha que estou mais gorda ou não? - dessa vez, com uma leve pitada de raiva adicionada.

- Você deve estar vendo coisas, meu amor. Até estou te achando mais magra. Continua com aquele mesmo corpinho de vinte.

Verdade, menti, mas escapei de conhecer o Diabo de salto alto.

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

Como decidir em quem votar

Se algum familiar seu é político, se você será beneficiado por algum candidato, se você é socialista, ou se já vendeu o seu voto, esse post não serve de nada para você, mas se você faz parte da grande maioria de brasileiros que ainda está pensando em quem irá te foder menos durante os próximos quatro anos, ele foi feito para você.

Uma coisa que percebi durante essa época de campanha eleitoral, é que é muito difícil ter certeza do seu voto. Você não sabe em quem acreditar, nem quem pode ou não fazer algo pelo país. Um lado político acusa o outro para logo depois ser envolvido em algum escândalo. Então, como tomar uma decisão? Cheguei a seguinte conclusão: não escolha quem você quer que te represente, mas sim quem você não quer ver por lá. Se você conseguir eliminar todos os que você não quer, o resto você pode escolher por sorteio. Ou no palitinho, quem sabe.

E como excluir esses que você não quer? Muito fácil, comece pelos que já se envolveram com escândalos. Depois passe para os que te acordam com o carro de som no Domingo pela manhã, ninguém merece acordar de ressaca com uma música só com o refrão. Em seguida, parta para os que atrapalham o trânsito, seja com carreatas, comícios ou carros de som lentos. Não esqueça de eliminar os atores decadentes, os que ganhavam dinheiro por causa do corpo e os que batem na mulher, marido ou filhos. Lembre também dos que tem ideias e pensamentos diferentes dos seus. Por último, esqueça todos aqueles que pretendem tirar o que você conquistou através do seu trabalho para dar àqueles que só fazem reclamar da situação em que se encontram.

Pronto, agora você tem uma pequena lista de candidatos que podem merecer o seu voto. Como? Não sobrou nenhum? Certeza? Já conferiu? Mas que pena, viu? Faz o seguinte então, vota nulo e mais sorte pra você nas próximas eleições. Pra você e pro resto do país.

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Viva la revolución

A faculdade é um lugar intrigante. Você encontra pessoas de todos os tipos e das mais diversas tribos. É inevitável. Você pode escolher em que horário você vai pegar tal matéria, mas não pode escolher quem vai dividir a sala com você. Dessa forma, acaba convivendo e conhecendo pessoas que você nunca imaginou conhecer. Hoje, conheci inúmeros socialistas. Não por vontade própria.

Após ter almoçado, quando voltava para a UFS, recebi um folheto do PSOL. Partido esse que nunca levei a sério e continuei sem levar. Ao lado deles, três belíssimas mulheres entregavam panfletos do show de amanhã. Peguei ambos e joguei-os na lixeira mais próxima que encontrei. Ela já estava praticamente lotada com os folhetos do partido. Segui em frente e fui para a sala, a tarde estava apenas começando.

Depois de três aulas que, para ser bem sincero, custaram a passar, segui para a didática um para assistir a última aula e ir para casa. Ao chegar na sala, dei de cara com dois alunos carregando uma cadeira cada. Dei passagem para os dois e entrei numa sala com apenas metade das cadeiras. Assim que entramos, entrou outro cara perguntando se ali iria ter aula. Respondi que sim e disse que iríamos precisar das cadeiras. Ele apenas saiu e foi pegar cadeiras de outro lugar. Nem pediu desculpas pelas que já tinha levado. No peito, estava colado um adesivo que dizia em letras maiúsculas: PLÍNIO 50.

Sai da sala e fui atrás do cara. Ele estava reunido com outros estudantes e alguns professores do lado de fora da didática. No gramado, estavam duas mesas e, ao redor delas, as cadeiras que haviam tirado da minha sala. Pouco a pouco, as pessoas foram se acomodando. Pouco depois, uma mulher tomou o microfone e teve início a reunião:

- Companheiros, peço àqueles que ainda não assinaram a lista aqui presente para que se dirijam aqui à mesa para assiná-la. Bom, hoje falaremos sobre os problemas da faculdade. Problemas que vocês já estão acostumados como por exemplo: falta de professores nas salas, precariedade das instalações...

Da porta da didática, eu retruquei:

- E na minha sala que tem professor, tem quadro, tem giz, tem aluno e não tem cadeira porque vocês levaram, faz como?

Graças à Deus, eles não escutaram.

Foi aí que eu finalmente entendi a essência do socialismo. Não tinha maneira mais prática de entender como ele funciona. É óbvio que tinham cadeiras a mais na sala, mas eles não sabiam quantas, portanto, não poderiam pegar. Pegaram mesmo assim. As cadeiras que eram nossas, naquele momento, foram tomadas e repartidas entre eles. Para, logo em seguida, eles criticarem a falta de condições, material e professor na sala de aula. Sentados no que antes era nosso. E ainda acham que algum de nós iria votar neles. Vamos todo mundo voltar pra sala estudar que é o melhor que fazem?

No fim das contas, atrapalharam a aula na metade para devolver parte das cadeiras. E viva la revolución!

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Cotidiano

- Você sabia que tem horas que eu ligo aqui pra casa? Até pra levantar essa bunda da cadeira e ir atender o telefone você tem preguiça. Sabia que eu precisava muito falar com você?

- Sabia, mas não atendi porque não era pra mim.

- Como não era pra você? Estava louca atrás de você. Te liguei milhões de vezes e depois te mandei inúmeras mensagens. A merda do celular ta aí do lado e você nem se deu ao incômodo de esticar o braço e ver que era eu. Sabia que eu realmente precisava falar com você?

- Sabia, mas não atendi porque não era pra mim.

- Claro que era pra você! Precisava que você fosse pegar os seus irmãos no colégio. Prometi que ia buscá-los, mas acabei me atrasando. Os bichinhos já estavam morrendo de fome.

- Quer dizer que eu trabalho e estudo a semana inteira e, no horário do almoço, que é o único momento que eu tenho pra relaxar, você me ligou para que eu fosse cumprir a promessa que você fez?

- Exatamente.

- Tá vendo que não era pra mim?

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Vida e morte de um escritor

Era um escritor em início de carreira. Era. Morreu alguns dias após ter lançado o seu primeiro livro.

Escrevera um romance. Uma comédia romântica para ser mais exato. As pessoas sempre querem mais comédias românticas. Mesmo se o autor mudar apenas o título e o nome dos personagens, elas ainda assim comprariam o novo livro. Foram meses trabalhando duro. Observou os casais de mãos dadas nas ruas. Prestou atenção nas conversas, na forma em que discutiam e logo em seguida faziam as pazes. Bastaria o namorado olhar para outro rabo de saia e a história se repetiria. Só tenho olhos pra você, meu anjo, nunca olharia para ela quando posso olhar para você aqui. Ela acreditaria e ele agradeceria pelo amor ser cego.

Seu editor reclamou de alguns capítulos, elogiou outros. Mudou apenas o que quis. Era seu livro. Trocaria de editora, mas não abriria mão da sua liberdade de expressão e das suas ideias. Esse foi o seu primeiro erro. Por fim, o livro foi aceito. Era um bom livro, pensava o editor. Era um best-seller, pensava ele. Esse foi o seu segundo e último erro.

Não tinha inimigos, mas isso não era necessário. Alguém tem que morrer para que alguém possa continuar a viver. Ele foi o escolhido. O assassino fora contratado por um jornal. Tinha algo em comum com a vítima, esse também seria o seu primeiro trabalho. Precisava conhecer mais sobre o alvo. Recebeu das mãos do contratante o livro que o coitado levara meses para terminar e leu para entendê-lo melhor. Optou por usar armamento pesado e atirar no ponto fraco.

Dois dias depois, como fez todas as manhãs dos últimos meses, o escritor saiu de casa cheio de si. Tinha uma tarde de autógrafos marcada para aquele mesmo dia. Primeiro faria um discurso, agradeceria todas as pessoas que o apoiara do livro, mesmo sendo poucas, depois um coffe break e, por fim, distribuiria algumas cópias autografadas e autografaria os demais. Jovens e adultos estariam lá para prestigiá-lo. Bela obra, tenho certeza que ficarei emocionada na mesma medida que me divertirei com os personagens. Faltava agora ter um filho e plantar uma árvore. Não necessariamente nessa ordem. Mal sabia ele que a morte o esperava na esquina.

O jornaleiro já o aguardava com o jornal na mão, mas, pela primeira vez em muitos anos, ele entregou o jornal e virou as costas. Não que isso tivesse chamado sua atenção. Ele estava muito animado para prestar atenção em qualquer outra coisa que não fizesse parte do seu mundinho particular. Abriu o jornal ali mesmo e foi direto para parte que o interessava. Poucos segundos depois, estava caido no chão. Foi levado por uma ambulância até o hospital. O médico o examinou, mas não tinha dúvidas, o escritor estava morto. Um único disparo. Um tiro de crítica negativa à queima-roupa no ego foi a causa do óbito. Nunca mais voltaria a escrever.