quinta-feira, 12 de agosto de 2010

Obscuro 2 - As coisas como realmente são!

Ele não estava lá quando me mudei.

Meus pais me expulsaram de casa quando eu completei 18 anos. Por mim eu ficava lá pra sempre. Alguém pra lavar minhas roupas e fazer minha comida. Tudo pronto, arrumado e bem feito. Mas meus pais me expulsaram. Saí do paraíso pra me virar no inferno.

Arranjei um emprego como frentista num posto de gasolina, num bairro distante de casa. O emprego era uma droga e eu, obrigado a passar noites acordado, mal tinha tempo pra estudar. Mas tinha um dinheiro no final do mês que garantia o sustento. Aluguei um apartamentozinho de um quarto e que ficava em cima de uma padaria, a poucas ruas do trabalho. O lugar era um lixo: cheio de mofo, apertado, e a noite o silêncio era incômodo. No quarto tinha um armário velho, com duas prateleiras que usei pra guardar as poucas tralhas que tinha. Pensei em comprar um armário novo, mas não tinha condições. Achei melhor usar aquele velho. Estava lascado.

A primeira vez que ouvi aquele barulho estava vomitando no banheiro, bêbado. Era um barulho chatinho, como se estivesse destruindo alguma coisa. No primeiro momento não dei muita atenção, pois achei que era o efeito do álcool em meu cérebro. A segunda vez foi um domingo de intensa ressaca. Apenas bebi muita água e tentei não pensar naquele barulho, afinal, agora tinha algo que quebrasse o silêncio em casa. Mas na terceira vez, não tinha álcool ou ressaca, o barulho parecia realmente estar destruindo alguma coisa. Comecei a me preocupar. Quais seriam os efeitos do cheiro de gasolina no cérebro humano?

Larguei o emprego, briguei com o dono do bar, até com o senhorio. Tinha que culpar alguém ou alguma coisa. Mas nada disso deu certo. O barulho aumentava a cada dia. Mudei de bar e bebi mais. Procurei em casa, quebrei a cama achando que era ela, joguei vinagre pelo quarto, e nada. Sobraram-me duas opções: Ou a cachaça estava me matando, ou o barulho vinha do armário infeliz.

Dobrei a camisa, peguei uma marreta e fui em direção ao armário. Chegando perto, minhas pernas tremeram e o suor desceu pela testa. Quando olhei mais embaixo, vi um buraco na porta. Ele não estava lá quando me mudei. Abri a porta decidido. Apontei a marreta, à procura do causador do barulho. Foi quando ele correu de um lado pro outro, sorrindo de mim. Então, a verdade me atingiu sem piedade: o filho da mãe era maior do que pensava e eu morria de medo dele.

Larguei a marreta, saí correndo do apartamento e implorei pra voltar pra casa.

O rato ficou lá, ganhou o terreno. Hoje eu lavo pratos, ajudo no almoço e tenho dois empregos, além da faculdade à noite. Ele não estava lá quando me mudei, mas ficou quando eu saí. Quem diria que alguém do meu tamanho fugiria de um roedor desgraçado? 


P.s.: Texto original em - http://embriaguezverbal.blogspot.com/2010/04/obscuro.html

2 comentários:

Bruna Tavares disse...

Caramba, mesmo já tendo lido o outro texto e, consequentemente, sabendo mais ou menos a lógica da coisa, o final consegue surpreender a gente da mesma forma oO Incrível isso :D Ficou ótimo. Tá de parabéns Duca!

:*

Diego Felizola disse...

Só não fiquei chateado com a adaptação que você fez porque ela conseguiu superar a original.

É mais um texto para mostrar o quanto você é competente para escrever nesse blog,só precisa atualizar mais ;P