quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

Medo

O homem de bermuda se arrastava pelas ruas do Porto e o medo ia atrás. Seguia alheio ao frio, flanqueado por crentes e descrentes, como um prisioneiro no corredor da morte. Não sabia se apressava o passo e acabava com aquilo ou se retardava a marcha para dilatar o inevitável.

Olhou para trás a tempo de ver o medo correndo em sua direção, mas não permitiria ser alcançado. Mente e corpo inebriados com a sensação de poder, nada tomaria aquele momento das suas mãos. Era o Alfa e o Ômega. Senhor de si.

Imaginou quantos haviam percorrido aquele mesmo caminho e sentido aquele êxtase, para, então, emergirem vitoriosos. Tum tum. Despiu-se de toda a vaidade que vestia. Tum tum. Lembrou de tudo que enfrentara nos últimos seis meses e que o levaram até ali. Tum tum. Pensou na família que estava em contagem regressiva para a sua volta. Tum tum, tum tum. Calculou rapidamente quantos metros o separavam da água e chutou quantos mais o separariam do fundo. Tum tum, tum tum. Sentiu o vento frio tentando desviar a sua atenção enquanto o medo se apoderava do seu corpo. TUM TUM TUM TUM.

Esqueceu o motivo de estar ali. Tinha medo de altura, de morrer, de ir sem dizer adeus, de deixar a família triste, de não deixar herdeiros ou um legado. Fazia graça para esconder o desespero. Queria desistir, mas o corpo continuava. Cruzou a grade da ponte e sabia que não poderia retornar. Desistiu de resistir.

Olhou para baixo e experimentou o sabor de adrenalina do medo. Ainda assim, sentiu se mais corajoso do que nunca. Um. Continuaria vivo para rever todos. Dois. Se formaria para mudar o mundo. Três. Dominar para não ser dominado. Fodeu, puta que pariu.

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