domingo, 30 de março de 2014

Apenas mais uma de amor (20) - Amor maior

Lembrava da primeira vez que ela lhe chamou de pai. Claro que não era verdade e logo a corrigiram, mas foi o suficiente para desencadear a série de eventos que aconteceram no decorrer dos dois seguintes anos. Talvez as coisas já estivessem determinadas a acontecer, só levariam mais tempo. Tempo que não sabiam que não iriam ter. E que não teria mudado em nada se soubessem.

Não a via sempre, nem mesmo todas as semanas. Mesmo assim, todo dia era melhor que o anterior. Era ela que tudo alegrava quando saía cansado do trabalho para visitá-la. Todos os defeitos que tinha e que não conseguia enxergar coloriam qualquer dia cinza. Suas perguntas sem pé nem cabeça, seu riso fácil e a voz manhosa quando queria alguma coisa. De novo, de novo, e lá se ia mais uma infinitude de vezes da mesma brincadeira. Os braços cada vez mais fortes para aguentar o peso que crescia nas mãos. O peso da diminuta vida pela qual era responsável. A vida que a vida tomaria.

Era questão de tempo e nada mais. Ela tinha pai, vivo e, acima de tudo, saudoso. A notícia de que ele voltaria ao Brasil para levá-la foi recebida com ceticismo. Que besteira, que bobagem, levar a menina só por conta disso. Não dava palpites, apenas balançava a cabeça e concordava. Não tinha o direito de opinar. Nem mesmo acreditava que esse dia chegaria. Mas chegou.

E lá estava ela, mochilinha nas costas, tiara na cabeça. Nada mais de Dora ou de Galinha Pintadinha, muito menos músicas diferentes todos os dias ou brincadeiras repetitivas. Ela estava com o pai verdadeiro, não havia nada mais que pudesse ser feito. Nem ao menos sabia como se sentia. Não havia nada, nem raiva por a levarem, nem alegria por vê-la feliz. Por fim, se foi. Foi se, como houvesse uma passagem de volta esperando por ela. Só havia o pai.

Não era o pai dela, nunca seria. Ela, mais do que ninguém, sabia. Não era o pai dela, mas era como se fosse.

2 comentários:

Bruna Tavares disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Saulo disse...

Foi, veio. Agora venha logo voce tambem, que sua sobrinha esta lhe esperando. So cuidado pra nao querer ficar.